Olá, papais e mamães, vovôs, vovós, tios e tias, professores e cuidadores,
Quem aí teve uma infância com atividades ao ar livre, no quintal de casa, em sítios ou fazendas? Quais as lembranças você carrega dessa época? Eu brincava de barquinho de papel na enxurrada, corria na grama, tomava banho de rio, andava à cavalo, pulava elástico e amarelinha na porta de casa com uma turma grande e animada. Me lembro de subir na mangueira ou jabuticabeira e comer esses frutos sentada nos galhos das árvores. Estas memórias têm cheiros e sensações únicas e foram muito importantes para que eu me tornasse quem sou.
A realidade das crianças de hoje é um pouco diferente, não é mesmo? Nossas vidas estão uma correria, moramos em prédios de concreto e vidro e telas protetoras. As crianças não brincam mais como antigamente e poucas têm contato com outras crianças fora da escola. Mesmo em prédios e condomínios, as brincadeiras são menos livres e os brinquedos comprados, como legos, bonecas incríveis e carrinhos de controle, além de video games, são interessantes e prendem a atenção dos pequenos. No entanto, estas brincadeiras estão longe de explorar o potencial motor, cognitivo, sensorial e criativo da infância. Qual a última vez que a criança pisou no barro ou sentiu o cheiro da grama após uma chuva ou procurou as constelações em um céu estrelado?
Crianças e adolescentes estão experimentando e sentindo o impacto da Covid-19 de várias maneiras diferentes: mudanças na relação com a escola, maior permanência em casa com as famílias, aumento do tempo de uso de telas, assim como mudanças em sua saúde física, emocional e bem-estar. Pesquisadores em todo o mundo ainda tentam estimar os impactos emocionais, físicos e cognitivos do longo tempo de isolamento decorrente da pandemia e do estresse dentro das famílias.
Uma metanálise que avaliou dados de 29 estudos, incluindo 80.879 jovens de todo o mundo, concluiu que as estimativas de incidência de depressão e ansiedade infantil e no adolescente, durante a pandemia de Covid-19 são da ordem de 25,2% e 20,5%, respectivamente. O estudo concluiu ainda que a prevalência de sintomas de depressão e ansiedade durante a Covid-19 dobrou, em comparação com as estimativas pré-pandêmicas.
No Brasil, uma pesquisa realizada pela Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (FMCSV) indicou que, na pandemia, 27% das crianças de 0 a 3 anos voltaram a ter comportamentos que tinham quando eram mais novas, segundo a percepção dos pais. Em outro levantamento também realizado pela FMCSV, dessa vez em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro, crianças da pré-escola, entre quatro e cinco anos, apresentaram sinais de déficit no desenvolvimento da expressão oral e corporal no período de suspensão das aulas presenciais, de acordo com a avaliação dos educadores.
Em relação aos adolescentes no Brasil, uma pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) sobre os impactos da pandemia nessa população apontou que 48,7% têm sentido preocupação, nervosismo ou mau humor, na maioria das vezes ou sempre. Houve aumento no consumo de doces e congelados, bem como no sedentarismo: o percentual de jovens que não faziam 60 minutos de atividade física em algum dia da semana antes da pandemia era de 20,9%, e passou a ser de 43,4%.
Já bastante confinados antes da pandemia, as crianças e adolescentes ficaram ainda mais sedentários e perderam as poucas oportunidades que tinham de brincar, praticar atividades físicas e conviver entre si, do lado de fora, vinculando-se com a natureza e com a vida. Precisaremos de todos os esforços possíveis a fim de mitigar os impactos da pandemia e fortalecer essa geração que irá enfrentar tantos desafios, incluindo os impactos das alterações climáticas, a desigualdade social e econômica, e as consequências das rápidas mudanças tecnológicas.
Há evidências sólidas de que criar e possibilitar o acesso de crianças, jovens e famílias a espaços naturais diversos e acolhedores pode contribuir muito para a recuperação de sua saúde e bem-estar, bem como para o fortalecimento de vínculos e conexões sociais.
Afinal, as áreas verdes são soluções baseadas na natureza não apenas para as questões ambientais, mas também para a melhoria da saúde pública. Simultaneamente, aumentar o número de áreas verdes seguras e conservadas, e distribuí-las de forma mais equâni- me no território, nos ajudará a construir uma cidade mais segura, sustentável, resiliente, includente e solidária.
As atividades físicas, naturalmente desenvolvidas em contato com a natureza, apresentam potencial para reduzir a gravidade das infecções pelos efeitos positivos dos exercícios sobre a imunidade, hábitos de sono, pressão arterial, controle do peso, glicemia e infecções respiratórias virais. Adicionalmente os benefícios para a saúde mental são enormes, desde a redução do estresse contínuo e dos sintomas de depressão e ansiedade, com reequilíbrio hormonal do cortisol e sua repercussão no sistema imunológico e nas inflamações.
O reconhecimento do direito ao brincar e ao convívio do lado de fora, ao ar livre, em contato com a natureza, está fundamentado em diversos marcos legais ligados à infância e é reconhecido pela Sociedade Brasileira de Pediatria como uma prioridade. Durante a pandemia, esse direito foi negado tendo em vista a necessidade de prevenir a transmissão viral. Agora é o momento de rever estratégias e trabalhar pela redução dos danos.
Acreditamos que incentivar o acesso ao brincar e ao convívio social ao ar livre, sem aglomerações e sempre usando máscaras, ajudará a mitigar o longo impacto da pandemia na saúde e no bem-estar de uma geração de crianças e adolescentes.
Minha sugestão é Planejar com as crianças, adolescentes, o plano de “dieta de na- tureza”, baseado na pirâmide apresentada abaixo, de acordo com a faixa etária de cada criança, de forma a procurar garantir que tenham acesso à natureza de forma cotidiana e frequente:
Brincar no parquinho mais próximo pelo menos uma hora por dia;
Fazer um passeio ou caminhada num jardim ou na orla de uma praia ou lagoa;
Fazer um piquenique num parque diferente uma vez ao mês;
Assistir ao pôr do sol e ao início da noite e procurar estrelas;
Passar o final de semana ou período de férias em algum lugar natural ou onde as crianças e os adolescentes possam se locomover com autonomia e liberdade, com regras de supervisão e proteção social.
Qual a sua sugestão para que outras famílias? Escreva um comentário e compartilhe este artigo com outras pessoas. Precisamos de mais natureza nas vidas de nossas crianças e jovens.
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